Para quem pára e se depara com o título, acredito haver grande questionamento se o mesmo tem algum nexo ou não. O fato é que para mim eles fazem muito sentido se colocados na ótica correta.O texto está um pouco extenso, mas acredito que conteve tudo que queria externar. Algumas experiências aqui são do passado, e ficaram por lá. Apenas retomo ao passado por entender que o mesmo nos ensina e nos impede de vacilar no presente e no futuro. Não é intenção do texto discutir o fato, mas apenas tirar aprendizado da experiência. Portanto, vou me ater aos detalhes que julgo importantes para a reflexão apenas.
Esses dias me coloquei em uma discussão sobre as igrejas emergentes com um amigo (por enquanto) virtual, e sobre a grande vontade de alguns cristãos de terem um ambiente mais prazeroso e adequado para se viver o cristianismo verdadeiro. Me deparei, ao ler os documentos e comentários, com uma sombra do passado que vivenciei em uma igreja que viria a se tornar emergente. Não necessariamente minha experiência será a mesma de todos, mas é de se temer que isso ocorra.
Ao iniciar meu mestrado, e após frequentar durante quatro anos uma igreja excepcional, em Viçosa (a IPV), voltei para BH e procurei durante alguns meses algum local para congregar. Encontrei no meu bairro uma igreja iniciante, com projetos bem interessantes. O pastor titular me acolheu bem, e me falou sobre algumas ideias super legais que me encheram os olhos. Bibliotecas, livraria, prédio multiuso, intercâmbios internacionais, oportunidade de continuar meus projetos missionários, e por aí vai.
Quando cheguei à igreja, a mocidade estava apenas começando, e éramos apenas 3 pessoas com idade e status civil (solteiros) para formar a mocidade. Foi-nos delegado um pastor auxiliar, com o intuito de tocar o projeto. À princípio, percebemos uma certa dificuldade de aproximar os jovens, visto que muitos que frequentavam não eram do bairro, ou não estavam a fim de se comprometer com o grupo. Ninguém é obrigado mesmo, mas foi bastante custoso iniciar os trabalhos.
Com o passar do tempo, o grupo foi crescendo, e notei algo interessante: o que movia e unia o grupo não eram os interesses em comum. Éramos por demais diferentes. O que nos unia era a presença e empenho do pastor auxiliar, que com toda a dedicação do mundo, apesar do grupo pequeno, enxergava ali pessoas que precisavam de comunhão.
As pregações daquela igreja eram quase sempre ministradas pelo pastor titular. O pastor auxiliar, que trabalhava com os jovens, pregava a cada 3 ou 4 meses. O teor das pregações do pastor titular também eram um tanto quanto estranhas. Além de repetir inúmeras vezes alguns de seus sermões, o mesmo não apresentava uma visão parcial do caráter de Deus. O Deus apresentado nas pregações era apenas amor, compassivo, achegado ao pecador, e quase que incapaz de punir uma pobre ovelha, vítima de seus pecados!
Além disso, nossa igreja era considerada especial! Eram-nos apresentados projetos que renderiam o bairro, a cidade, o país aos pés de Jesus! Porém, não fazíamos nada de diferente das outras igrejas! Viagens para fora do país para buscar recursos que retornaram totalmente improdutivas, projetos de compra de terrenos que eram veiculadas no púlpito, inflamavam a igreja e depois acabavam indo por água abaixo, e por aí vai. Comecei a perceber também que algumas pessoas, anteriormente ativas na igreja, acabavam por se tornar membros "de banco".
O que acontecia era mais ou menos assim: os projetos eram lançados nas mãos dos membros para motivá-los a se estabelecer na igreja. Membros neófitos recebiam cargos e funções de grande impacto para a igreja, e geralmente isso se dava com pessoas em boas condições sociais e econômicas. Quando os projetos estavam pequenos, a pessoa se matava de trabalhar. Quando os mesmos começavam a crescer, o pastor se aproximava e reorientava todo o trabalho para que ficasse a sua cara. Saía em todas as fotos e se esbanjava ao mostrar como seu trabalho era profícuo. E foi assim também com a mocidade...
Conversando com algumas pessoas, vi que os membros se cansavam e se esgotavam com o trabalho, e entravam em constante atrito com o pastor titular. E aí não demorou muito tempo para que eu fosse atingido também.
Resumindo (ou tentando resumir) a história, os membros que não participavam mais de perto das ações da liderança se encantava com as pregações no púlpito e compravam a ideia de que nossa igreja era a salvação do mundo. Os projetos ganhando corpo tinham maior ênfase na pessoa do pastor titular, e o mesmo sempre fazia questão de colocar-nos como uma igreja com visão destacada, que fugia da denominação à qual estávamos filiados.
Resultado: a igreja rachou. Não somente por esses motivos, mas também por esses. Uma nova igreja foi criada com outra denominação. Os "especiais" se tornaram uma igreja livre das amarras denominacionais, e se renderam aos projetos impressionantes do pastor titular.
A história é longa, e tem outros melindres que não cabem aqui. Se chegou até aqui, peço mais paciência para entender onde tudo se encaixa.
A igreja evangélica brasileira apresenta na figura do pastor um símbolo de grande porte relacionado com santidade, poder, corretude e divindade. Não é difícil encontrar com um evangélico que, ao ouvir um pastor dizer algo, toma aquilo como verdade sem sequer analisar o que está sendo dito. A palavra do pastor é a máxima em qualquer assunto, e o mesmo deve sempre se pronunciar, para que as ovelhas se sintam seguras.
Ora bolas, Jesus cuidou de seus discípulos, preparando-os sempre para quando Ele não estivesse mais aqui. Se não houvesse essa preocupação e dedicação por parte do Messias, dificilmente o evangelho teria ganhado os contornos que ganhou após sua ressurreição. Mas não é isso que vemos nos dias atuais. Os pastores preparam suas ovelhas para serem sempre dependentes de sua liderança. Tratam-nas como coitadas, e não ensinam os seus discípulos a caminhar a vida proposta pelo evangelho de maneira plena. Resultado: rebanho tacanho, imaturo, sem ânimo e totalmente dependente do que o pastor falou ou ordenou.
Ovelhas supervisionadas são mais fáceis de controlar. Porém, até onde isso fortalece o Corpo de Cristo? Ao meu ver, isso nos faz regredir.
Daí, partimos para outro ponto que me inquieta bastante. Além de supervisionadas, as ovelhas são cobradas por sua "produtividade"! Quem não trabalha na igreja, não está servindo! Quem não tem ministério, está sendo negligente com Jesus, e certamente em pecado, uma vez que não está servindo à Deus!
A Reforma Protestante foi um marco histórico, e que mudou a concepção dos cristãos em relação ao trabalho. Quando foi entendido que tudo é sagrado, menos o que envolver o pecado, quebrou-se a dicotomia natureza-graça, ciência-religião, trabalho-igreja e qualquer outra que contamine o evangelho deixado por Jesus. Porém, parece que as lideranças atuais querem voltar ao modelo medieval-católico-romano. Esquecem de alimentar suas ovelhas para o dia-a-dia, de segunda a sexta, e apenas ensinam à essas que a vida e aquilo que é importante se resume ao fim de semana, quando estão todos na redoma da sua congregação local.
Somos chamados para viver uma vida integral diante de Deus. Não é certo faccionar momentos sagrados e momentos seculares. E muitos pastores pregam isso! Mas não permitem que suas ovelhas vivam o que pregam! Quantas vezes você ouviu em uma pregação sobre a importância do profissional cristão na proclamação da soberania de Cristo em todas as áreas? Quantas vezes você ouviu uma palavra de motivação no púlpito para o advogado, médico, juiz, ou outro profissional que abre mão de benefícios ilícitos em prol do evangelho? Quantas vezes já se ouviu sobre as vocações científicas da igreja, que são fundamentais para que a academia não caia nas mãos de neoiluministas?
E aí, as ovelhas supervisionadas, cobradas por produtividade eclesiástica, ainda sofrem quando querem se tornar livres. Me parece que na igreja evangélica brasileira (não estou generalizando, apenas ponderando sobre a maioria), é proibido pensar, como diz João Alexandre em sua polêmica música. Questionar os trabalhos, ou discutir os projetos é algo proibido também. Devemos confiar cegamente que tudo está sendo feito da melhor maneira possível. Críticas não são bem vindas. São coisas do inferno para derrubar lideranças. Reuniões de todas as esferas da igreja devem ter a presença máxima do pastor da igreja, com o intuito de impedir erros ou desvios na caminhada.
E aí eu chego ao avivamento. Pode parecer pesada toda essa exposição, e não me eximo dos erros que eu possa ter cometido ao deliberar sobre esse assunto. Caso os tenha cometido, já peço perdão de antemão àqueles que se sentem injustiçados. Mas continuo com minha posição firme, que pode apontar uma saída diante desse quadro tenebroso. O avivamento é a solução para a igreja brasileira. E o avivamento se resume a oração fervorosa e constante e estudo da Palavra. Nada mais do que isso. Não envolve trabalhar mais na igreja, encher a paciência de toda a sua família com versículos decorados, nem de megashows na praça com cantores famosos.
Não existe cristão mais inútil do que aquele que não estuda a Bíblia (disse um teólogo que não me recordo no momento). Não há cristão mais inútil do que aquele que não questiona aquilo que ouve, ou que não confronta o que não condiz com aquilo que crê. E aí temos um problema. Cristãos que querem o verdadeiro avivamento, a meu ver, não se enquadram no modelo de igreja criado pelos líderes atuais. Eles irão criticar veementemente o que acham errado. Eles terão iniciativa para projetos que vão além da alçada e competência pastoral. Eles não se preocuparão com a produtividade, pois guiados pelo Espírito farão aquilo que é demandado por Deus.
Voltando ao exemplo dado no início do texto, não é difícil de se vivenciar a tentativa de controle total de uma igreja por parte de lideranças. Devemos valorizar líderes que se desprendem do ego pastoral, e que, como pastores, apoiam os ministérios e as vidas em sua igreja de forma saudável. Devemos valorizar líderes que entendem que a igreja é uma das esferas da vida do cristão, e que respeitam suas ovelhas, não tratando-as como massa de manobra, ou mão de obra para seus projetos pessoais. Devemos desencorajar e desarticular a mentalidade cristã que reprime a crítica.
Não tenho a intenção aqui de julgar ninguém, muito menos de criar inimizades. Porém, não posso me deter a falar o que nos é ensinado todos os dias por Deus, em Sua Palavra. E a Palavra, felizmente, me exime de qualquer acanhamento ao procurar lutar por uma igreja que perfaça a Vontade maior, perfeita, séria, coerente e que não envolve interesses próprios nem achismos.
Que Deus nos ajude!