quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

Reflexão sobre o encontro do jovem rico com Jesus

O jovem rico (Mt 19:16-26)

Jesus já era bem conhecido, e estava viajando pela Judeia, além do Jordão (19:1), onde insistentemente era interrogado pelos saduceus. Jesus estava próximo de sua entrada triunfal em Jerusalém, onde seria aclamado pelo povo.

Jesus acabara de pregar aos discípulos a necessidade de serem como crianças para entrar no Reino dos céus, dizendo a eles que deixassem as crianças irem até ele.

Agora, Jesus contrapunha a sua pregação anterior, mostrando como é difícil para os adultos herdarem o Seu Reino.

O jovem rico interrompe Jesus com uma pergunta de difícil interpretação. Uns entendem que o jovem perguntou sinceramente e, por desconhecimento de quem Jesus era, o colocou no nível do mestre. Outros entendem que o jovem, de forma sagaz, quis bajular a Jesus, chamando-o de Bom. Creio ser a segunda alternativa mais prudente, diante dos fatos que sucederam a pergunta inicial.

O jovem questiona o que é preciso ser feito para herdar a vida eterna. A pergunta do jovem revela sua ignorância em relação a Jesus (que é Deus) e do caminho da salvação (pela graça). O jovem se atém às dívidas ao invés da dádiva, às obras em detrimento da graça.

Jesus responde aos dois problemas de ignorância do jovem.

1) A resposta de Jesus não é uma contradição. Jesus não está abrindo mão de sua divindade ao afirmar que só há um que é bom, Deus. Ele está dando mais uma chance ao jovem de reconhecer que Ele é Deus. A resposta esperada seria “Por isso Tu és Deus”.

2) Jesus confronta o jovem em relação a sua salvação, exortando-o a guardar a lei. A lei foi usada para convencê-lo de seu pecado. Jesus não estava inferindo que o jovem se salvaria por guardar as leis, mas queria confrontá-lo com o que deveria guardar.

A lei nos serve para mostrar que somos incapazes de obedecê-la. É o crivo que Deus nos dá para mostrar o quanto somos miseráveis e o quanto Ele é gracioso.

Todos os mandamentos citados por Jesus são mandamentos relacionados à vida com o próximo. O último mandamento citado por Jesus é o principal, e servia para mostrar ao jovem o quanto estava cego em seu egoísmo. Dado seu orgulho, ao afirmar que guardava a todos os mandamentos, Jesus então expõe sua falha, convidando-o a dar todos os seus bens aos pobres.

Isso tem algumas implicações:
1) Não quer dizer que o homem seria salva por dar os seus bens. A salvação estava em seguir a Cristo. É pela fé que ele iria conquistar o Reino.
2) Para se salvar, é necessário reconhecer que pecou e não alcançou as exigências santas de Deus. A negação do jovem em dar seus bens mostra que ele não amava ao próximo.

Uma possível resposta seria: “Senhor, se isso é necessário, então sou pecador. Não posso salvar a mim mesmo por meus esforços. Consequentemente eu te peço para me salvar por Sua graça.” Ao invés disso, ele se retirou em tristeza.

Jesus utiliza o contexto que se passa para mostrar aos demais à sua volta a dificuldade de um rico entrar no céu. Ele ressalta que:
1) As riquezas tendem a se tornar ídolos em nossas vidas. É difícil tê-las sem confiar nelas.
2) É difícil ver como um cristão pode acumular tamanha quantidade de dinheiro com tantos necessitados à nossa volta.

Charles Simeon foi pastor por 49 anos da Igreja da Trindade, em Cambridge. Após uma conversão ao entrar em contato com um livro sobre a Ceia do Senhor em seu quarto na faculdade (março de 1779), Simeon teve uma ideia da sua necessidade de arrependimento.

Simeon era acusado por seus opositores por estabelecer um padrão de santidade inatingível. Simeon fugia de rumores, evitava fazer caça às heresias, tinha um forte senso de responsabilidade diante de Deus pelas almas e pregava firmemente que a bíblia deveria falar por si.

John Piper escreve sobre como Charles Simeon lidava com suas finanças da seguinte forma:
“Ele não dava a seus inimigos nenhuma brecha quando se tratava de estilo de vida e riqueza. Vivia de modo simples, como um homem solteiro em seu quarto de universidade, e dava todo o excedente de seu salário aos pobres da comunidade. Também recusou a herança de seu irmão rico, Moule disse que ele tinha “uma nobre indiferença ao dinheiro”. E seu envolvimento ativo com a assistência aos pobres das redondezas foi responsável em certa medida pela cessação dos preconceitos contra ele. É difícil ser inimigo de uma pessoa que é cheia de prática de boas obras. Foi dessa forma que ele seguiu o conselho de Pedro: “Porque assim é a vontade de Deus, que pela prática do bem, façais emudecer a ignorância dos insensatos” (I Pe 2.15)

Jesus, em seu sermão aos discípulos define uma hipérbole, ou um argumento ad absurdum, de que seria mais fácil um camelo passar pelo fundo de uma agulha.

Muitos teólogos afirmam que o fundo é um portão de entrada bem baixo, onde os camelos deveria passar ajoelhados, mostrando a possibilidade do fato. Porém em Lucas, na mesma passagem, o termo grego usado se refere à agulha usada por cirurgiões.

Jesus estava dizendo que realmente é impossível ao homem alcançar a salvação por si mesmo. Jesus não estava falando sobre dificuldade, mas sobre impossibilidade. Humanamente falando, um rico não pode ser salvo!

A maioria dos discípulos vinha de tradição judaica. As riquezas, nessa tradição, eram sinal de bençãos, e se questionaram quem poderia ser salvo.

Jesus então dá o caminho a ser traçado: o que é impossível ao homem, é possível a Deus. Somente Deus pode efetuar a mudança em um rico, e fazer com que ele deixe de confiar em meios visíveis de sustento para confiar na fé.

Jesus está mostrando que as riquezas acumuladas são as provas para que sejamos acusados de não amar ao próximo.

C.S. Lewis, em seu livro “Peso de Glória”, extrapola a ideia de entrega a Deus, e nos faz abraçar outros campos de nossa vida nessa relação com Deus.

Leitura: página 46 do livro “Um ano com C.S. Lewis”.

“Deus exige tudo de nós, porque ele é amor e é próprio dele nos abençoar. No entanto, ele não pode nos abençoar enquanto não nos possuir por completo.”


Alguns questionamentos:

1) Quando foi a última vez que reconheceu, com lágrimas e contrição, o seu pecado?
2) As disciplinas que eu faço, o profissional que estou me tornando, os sonhos que planejo incluem projetos de abençoar o próximo com aquilo que farei e receberei pelo feito?
3) Quais as áreas onde não aceito que as pessoas me mudem? Tenho feito isso também com Deus?
4) Tenho barganhado com Deus, prometendo coisas para ganhar outras?
5) A graça de Deus é real em minha vida, ou ainda me sinto preso por conta das leis impostas sobre mim?

Referências:
[1] Lewis, C.S. "O Peso de Glória", São Paulo. Editora Vida, 1949.
[2] MacDonald, W. "Comentário Bíblico Popular". Editora Mundo Cristão, 2011.
[3] Piper, J. "Raízes da Perseverança". Editora Tempo de Colheita, 2010.